Dois meses após decisão do STF, Governo Federal ainda não pagou valor integral de R$ 7 milhões para tratamento de criança do Paraná com doença rara
21/10/2025
(Foto: Reprodução) STF determina que governo pague remédio de R$ 7 milhões à criança com doença rara no PR
Dois meses após a decisão do Supremo Tribunal Federal que determinou o pagamento, o Governo Federal ainda não transferiu o valor total para a aplicação de um medicamento de R$ 7 milhões a uma criança do Paraná. Joaquim Burali tem dois anos e mora em Maringá, no norte do estado. Ele é portador de uma doença degenerativa rara chamada Atrofia Muscular Espinhal (AME) tipo 2.
Para o tratamento é necessária a aplicação de uma dose única do Zolgensma, considerado um dos medicamentos mais caros do mundo. E quanto mais cedo o tratamento for aplicado, maiores as chances de evitar danos motores permanentes.
A decisão que determinou o pagamento foi assinada no dia 21 de agosto pela ministra Carmen Lúcia. Até a última atualização desta reportagem, o Governo havia depositado somente R$ 5,5 milhões em uma conta judicial destinada à família da criança e informou que valor de complementação será depositado até o fim desta semana. Veja a íntegra da nota do Ministério da Saúde abaixo.
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Na decisão, a ministra determinou que a dose do medicamento seja custeada pelo Governo Federal, que também deve pagar as despesas com a internação, custos hospitalares e honorários médicos. Na época, a ministra do STF também apontou que o governo não devia recorrer da decisão.
"Ressalte-se que eventual recurso manifestamente inadmissível contra esta decisão demonstraria apenas inconformismo e resistência em pôr termo a processos que se arrastam em detrimento da eficiente prestação jurisdicional, o que sujeitaria a parte à aplicação da multa processual do § 4º do art. 1.021 do Código de Processo Civil", afirma o documento.
A advogada da família de Joaquim, Daniela Ávila, informou que a Novartis, farmacêutica responsável pelo medicamento, foi intimada para informar se aceita ou não fornecer o remédio por R$ 5,5 milhões. Apesar disso, também foi solicitado que, independentemente da resposta, o Zolgensma seja entregue e o valor seja complementado pela União posteriormente.
Em nota ao g1, a Novartis disse que foi notificada sobre o pedido e confirmou que a liberação do tratamento deve ser formalizada ainda nesta terça-feira (21). Veja abaixo a nota na íntegra.
"A Novartis informa que, assim que foi notificada sobre o pedido de fornecimento de Zolgensma® para o paciente Joaquim Burali, em 16 de outubro, iniciou os procedimentos internos e confirma a liberação do tratamento, em protocolo a ser formalizado ainda hoje (21). Agora, a companhia aguarda receber os dados clínicos do paciente para início de produção e fornecimento do medicamento. A Novartis reforça seu compromisso com o acesso responsável da terapia gênica para os pacientes com Atrofia Muscular Espinhal (AME), e permanece à disposição para eventuais esclarecimentos", informou a farmacêutica.
Segundo Lucas Matheus Rodrigues, que é pai de Joaquim, nos últimos meses os tremores do menino aumentaram e, por causa disso, ele não tem mais conseguido comer sozinho. O menino também passou a acordar mais vezes à noite, por estar com a respiração mais pesada.
"Nosso sentimento é de um perigo eminente contínuo porque as pioras dele são de repente. Joaquim é nosso terceiro filho. Ele luta pela vida dele, merece viver e ama a vida dele, sabe? Só que a gente acha injusto ele ter direito a um medicamento e por conta de burocracia não conseguir receber. E se, caso acontecesse alguma coisa irreversível, a gente nunca ia aceitar, sabendo que ele já tinha conseguido, sabe? Então, agora é somente fazer o governo executar isso, fazer o simples, fazer cumprir uma decisão do STF", disse Lucas.
De acordo com a Carta de Aprovação do Zolgesma pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), ele é indicado para o tratamento de pacientes pediátricos abaixo de 2 anos, período em que a aplicação do medicamento tem mais eficácia. Joaquim completou 2 anos no dia 10 de setembro, 21 dias após a decisão do STF.
Segundo a neurologista pediátrica Valéria Werner, no ponto de vista médico, o Zolgensma ainda pode ser aplicado em Joaquim, mesmo após ele ter completado dois anos. Segundo Amanda Burali, mãe de Joaquim, enquanto não consegue a aplicação do Zolgensma, o menino toma outros medicamentos e faz fisioterapia motora e respiratória.
Neste ano, o Ministério da Saúde viabilizou as primeiras aplicações do Zolgensma na rede pública para pacientes com AME tipo 1, após processos judiciais abertos pelo Ministério Público.
Nota do Ministério da Saúde
O Ministério da Saúde realizou o depósito no valor de R$ 5,5 milhões referente à decisão judicial em favor do menino Joaquim Burali, para a compra do medicamento Zolgensma, no dia 18/09. No começo do mês de outubro, o processo retornou com pedido de complementação do valor do depósito, considerando a tabela da Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED). O valor de complementação será depositado na conta judicial até o final desta semana.
Com o objetivo de atender mais crianças portadoras de Atrofia Muscular Espinhal (AME), o Ministério da Saúde firmou um Acordo de Compartilhamento de Risco (ACR) com a empresa fabricante para fornecer, via SUS, o tratamento para crianças de até 6 meses de idade que não estejam com a ventilação mecânica invasiva acima de 16 horas por dia. Nesses casos, o pagamento à fabricante está condicionado aos resultados clínicos obtidos pelos pacientes.
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Diagnóstico
Á esquerda, pai Lucas Mateus Rodrigues, Joaquim ao meio e, à direita, mãe Amanda Burali.
Reprodução/RPC
Segundo Amanda Burali, mãe de Joaquim, o menino foi diagnosticado com AME quando tinha um ano e três meses, após passar por vários médicos. Ela conta que os primeiros sinais da doença apareceram quando o filho tinha seis meses.
"Comecei a notar coisas que eram para ele estar fazendo e ele não estava. Faltavam os movimentos, faltava uma certa desenvoltura, por ele ser um pouco mais durinho. [...] Eu ouvia muito que ele era um bebê preguiçoso, mas via que não era, pois ele tentava ser ativo e via vontade nele", contou Amanda.
Segundo o Ministério da Saúde, a AME é uma doença rara, degenerativa e que interfere na capacidade do corpo de produzir uma proteína essencial para a sobrevivência dos neurônios motores, responsáveis pelos gestos vitais, como respirar, engolir e se mover. Aos poucos, os neurônios motores morrem devido à falta da proteína e os pacientes passam a apresentar os sintomas da doença, que pode levar à morte.
Os principais sinais e sintomas da AME são:
Perda do controle e forças musculares;
Incapacidade/dificuldade de movimentos e locomoção;
Incapacidade/dificuldade de engolir;
Incapacidade/dificuldade de segurar a cabeça;
Incapacidade/dificuldade de respirar.
"A partir desses últimos tempos, nós notamos que ele fica mais deitado porque ele cansa mais fácil. Ele tem uma cadeirinha, a gente, a gente dá o alimento para ele. Só que ele começou a apresentar dificuldade de deglutição, porque é uma doença degenerativa. Ele tem um tremor maior do que tinha antes, um cansaço extremo. Teve quadro de engasgos e hoje ele tem muito medo de se alimentar. Dia após o outro ele vai desgastando mais os músculos e o cenário pode mudar", contou Amanda.
Em busca do medicamento para o filho, a família de Joaquim entrou na Justiça. A esperança dos pais é de que o medicamento possa dar uma vida normal ao menino. "Eu brinco que a minha vontade é olhar pra ele e falar assim: 'Joaquim, para de fazer bagunça', diz a mãe.
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